Exposição à poluição por plástico amplia em 85% a probabilidade de adoecimento dos corais, aponta relatório

Projeto Mares monitora o comportamento da fauna coralínea e visa restaurar uma área de 1,5 km² no recife das Pinaúnas, em Mar Grande, na Ilha de Itaparica, com o cultivo em berçário e ‘plantação’ de aproximadamente 1,6 mil sementeiras com a espécie nativa Millepora alcicornis

Em um cenário desafiador, em que o mundo registrou nos primeiros meses de 2024 a quarta epidemia de branqueamento de corais em um espaço de tempo de 25 anos, um relatório divulgado no último dia 17 de outubro pela ONG Oceania, coloca ainda mais em evidência os riscos à saúde dos corais brasileiros. Segundo dados do relatório Fragmentos da Destruição: impacto do plástico à biodiversidade marinha brasileira, com 1,3 milhão de toneladas de plástico lançadas anualmente no oceano, o Brasil é o oitavo país do mundo e o maior poluidor da América Latina em descarte deste material. Esses dados consolidam a importância de ações de restauração e monitoramento da fauna coralínea, como a que vem sendo desenvolvida pelo Projeto Mares na Baía de Todos os Santos (BTS), a maior baía do Brasil e segunda maior do mundo – a BTS completa 423 anos no próximo dia 01 de novembro.

Realizado pela ONG Socioambientalista PRÓ-MAR, o Projeto Mares, iniciativa que conta com o apoio da Petrobras, por meio do Programa Petrobras Socioambiental, vem trabalhando desde janeiro de 2023, no monitoramento e restauração coralínea em uma área de 1,5 km² no recife das Pinaúnas, na Ilhota, em Mar Grande – Ilha de Itaparica. Desenvolvidas com base no Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 14, estabelecido pela Organização das Nações Unidas (ONU), que trata da Conservação e uso sustentável dos oceanos, dos mares e dos recursos marinhos para o desenvolvimento sustentável e ODS 13 – Combate às Mudanças Climáticas, as ações realizadas pelo projeto contribuem para destacar o pioneirismo da BTS como polo de pesquisas e exemplo para outras iniciativas que tenham como propósito minimizar os impactos dos efeitos climáticos e da poluição nos oceanos.

Vale destacar que, o documento publicado pela ONG Oceania afirma que, por ser leve, o plástico é facilmente transportado pelas correntes oceânicas, ficando preso e enredado em frágeis sistemas de recifes de coral. Essa exposição à poluição por plástico expõem os corais a um risco significativamente maior de contrair doenças, podendo assim, comprometer as suas funções biológicas. De acordo com estudos trazidos pelo relatório apresentado pela Oceania, ao entrarem em contato com fragmentos plásticos, a probabilidade de os corais desenvolverem doenças aumenta de 4% para 89%, ou seja, um crescimento de 85%.

Para evitar que os corais que estão sendo cultivados, assim como a população existente na área monitorada, sofram com mais esta ameaça, o Projeto Mares realiza com frequência atividades de limpeza de praia, mangue e submarina, recolhendo não só materiais plásticos, mas, também, outros tipos de objetos poluentes que podem gerar riscos tanto aos corais, quanto a todas as demais espécies marinhas. E, por consequência, trazer prejuízos às famílias que tiram do mar o seu sustento. As ações de limpeza resultaram na retirada de mais de 1,5 toneladas de lixo.

Cultivo e desenvolvimento em berçários trazem esperança diante de cenário de ameaças a vida das espécies coralíneas

Instalados a aproximadamente 1,2 km da costa, na praia da Ilhota, em Mar Grande, os berçários de corais que estão sendo cultivados pelo Projeto Mares trazem esperança diante do cenário de constante ameaça de extinção desse ecossistema que abriga cerca de 25% das espécies marinhas do planeta. Formados por uma espécie de mesa, confeccionada com tubo PVC e rede de nylon, os berçários são utilizados para o cultivo de fragmentos de coral de fogo, nome popular da Millepora alcicornis, espécie escolhida por sua maior adaptação ao ambiente alvo da regeneração proposta pelo Projeto.

Coordenador científico do Projeto Mares, o biólogo Lucas Lolis explica que 40 mesas berçários estão sendo utilizadas para o cultivo dos fragmentos de coral para que estes se fixem as sementeiras. Produzidas com substratos compostos por esqueletos de organismos bioincrustantes, estas sementeiras servem como base para o desenvolvimento dos fragmentos até que eles atinjam o ponto de formação de novas colônias e serem transplantados para o ambiente recifal. Destas 40 mesas, 32 estão no sítio que forma a fazenda marinha do Projeto, sendo que oito delas estão em seu segundo lote de plantio.

“Em cada uma destas mesas fazemos o cultivo e cuidado de em média 40 colônias. Nossa meta, já batida, é do cultivo de 1600 colônias, destas 370 já foram para o recife e 1230 ainda se encontram nas mesas aguardando atingirem o ponto certo para serem levadas ao ambiente recifal”, ressalta Lolis. Entretanto, o biólogo destaca que o número de colônias cultivadas no berçário foi maior: 1.664 no total. Sendo que 64 delas morreram em função do branqueamento que atingiu cerca de 50% dos fragmentos instalados nos berçários e outras ações como, por exemplo, a movimentação das ondas.

“Apesar das intempéries registradas durante o nosso cultivo, observamos que a maioria das nossas colônias se recuperaram, tendo sido registrado apenas 4% de mortalidade, um número muito baixo e, provavelmente bem menor do que no recife, onde apenas cerca de metade dos fragmentos se fixam e geram novas colônias enquanto o resto é soterrado ou acaba morrendo”, destaca Lolis. Segundo o biólogo, até o final do projeto, que acontece em dezembro deste ano, a equipe seguirá executando o monitoramento dos recifes que irão receber colônias. “Precisamos conhecer as características das comunidades biológicas antes de realizar a transferência e após o plantio das colônias do coral de fogo”, afirma Lolis.

“Neste ciclo, o trabalho tem sido realizado com muito empenho de todos os envolvidos, numa tarefa de esforço diário de mergulho e, também, de pesquisa para o desenvolvimento das melhores técnicas e procedimentos de cultivo. E, o mais importante, o Projeto vem sendo realizado com muito apoio vindo de parceiros da academia, da iniciativa privada e, principalmente, da população da ilha. Podemos afirmar que encontramos realmente um propósito em comum”, finaliza Lucas Lolis, ressaltando que mais recentemente o trabalho passou a contar, também, com a parceria da Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Sema) e do Instituto de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema).

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